De A a Z para a Música na Educação

De A a Z para a Música na Educação... por Bruno Cochat

Bruno Cochat

Lisboa, 5/4/1971. Licenciado pela Escola Superior de Dança – Ramo de Espetáculo. Iniciou os seus estudos em dança em 1983 na Companhia Nacional de Bailado e Ballet Gulbenkian.

Professor de Expressão Dramática na Escola Artística de Música do Conservatório Nacional desde 2003 até ao presente. Professor de Expressão Dramática na Escola Voz do Operário e na Escola Básica do Castelo (Lisboa).

Trabalha também como coreógrafo, destacando das suas criações:

NU MEIO – co-criação com Filipa Francisco

RITUAIS DE LUTO/A – EXPO 98

QUEBRA-NOZES – CCB

O PERIGO DA DANÇA – Teatro da Trindade

KOPD’ÁGUA – Clube Estefânia

CARPE DIEM – Teatro Camões/Companhia Nacional de Bailado

A FIXAÇÃO PROIBIDA – Centro Cultural Caldas da Rainha – Dia Mundial da Dança, 2010

BABAR, o pequeno elefante – Teatrinho do Conservatório Nacional.

1HD – Uma História da Dança – Companhia Nacional de Bailado AGORA – Grupo 23 – Silêncio. FMM (Sines) e Teatro São Luiz

Para o Atelier Musical da EMCN, encenou ou co-encenou “Flauta Mágica”, “Brundibar”, “Tutti Fan Frutti” e “Vamos Construir uma Cidade”, “Vou-me Embora, Vou Partir”, entre outros…

Colaborador regular do PAD - Projecto de Aproximação à Dança – Companhia Nacional de Bailado e da “Orquestra Geração”.

Formador da APEM – Associação Portuguesa de Educação Musical.

Professor e Produtor na Escola de Música do Conservatório Nacional, onde inaugurou a temporada de concertos “Le Foyer”. Programador do mês de Abril/2012 na Baixa-Chiado PT Bluestation.

Clique no seguinte link para ler este A a Z:

A

de ALFABETO.

Os primeiros passos a dar no ensino de qualquer matéria é a aquisição de códigos que, como letras, servirão mais tarde para criar as nossas frases, os nossos discursos. A seguir, irei enumerar aquelas que são as “letras” do meu alfabeto de Expressão Dramática no ensino vocacional da Música e que são comuns a todos os tipos de ensino que se centram na individualidade dos alunos e no desenvolvimento da sua inteligência emocional…

B

de BELEZA.

Permitirmo-nos, e aos nossos alunos, satisfazer-nos com o que é Belo, que não precisa de mais justificação ou explicação. “Gosto porque sim, porque me arrepia”, seja uma música, um som, um poema, um movimento ou uma imagem.

C

de CONCENTRAÇÃO/CONFIANÇA.

Estas são, têm de ser, as “portas de entrada” para o trabalho com crianças. Para tudo quanto queiramos apre(e)nder, necessitamos desenvolver a nossa capacidade de nos focarmos no assunto ou no objectivo. A estreita relação de confiança entre o aluno e o professor, o aluno e a turma e o aluno em si próprio, são meio caminho andado para o “sucesso”. Por sucesso, entendamos a capacidade que o aluno deve ter de se ultrapassar, de se surpreender.

D

de DANÇA.

Vindo da Dança, dar aulas de Expressão Dramática numa escola de Música, eu sou a verdadeira “pirueta” das artes performativas. É sempre através do Corpo que nos expressamos e é este que nos traz mais barreiras e constrangimentos. Consoante a idade dos alunos com que lidamos, varia muito a sua (como a nossa) relação com o seu Corpo e devemos, em qualquer situação apaziguar esta relação. A Dança, como a Música, não é uma, são muitas e, se todos gostam de algum género musical, o mesmo se passa (ou devia) com a Dança. Cabe-nos a nós, professores facilitar os processos de procura do género onde o aluno se sinta mais confortável.

E

de EXPRESSÃO DRAMÁTICA.

Esta é, só pode ter sido, a primeira forma de comunicação do ser humano. Antes de saber falar, o Homem sabia expressar. A expressão dramática obriga-nos, como a formação de um ator, a “descascar as várias camadas da cebola”, até chegar ao nosso interior, a partir do qual, se for o caso, se poderá então construir a persona/personagem. Este caminho leva-nos, inevitavelmente, ao autoconhecimento e a lidarmos de perto com as nossas emoções que estarão, assim, à vista de todos (quanto ao medo que isto provoca já iremos…)

A Expressão Dramática é também aquela disciplina onde cabe qualquer tema, onde se resolvem conflitos, onde, muitas vezes, a aula ganha um rumo próprio, diferente daquele que o professor tinha imaginado.

F

de FAMÍLIA.

No sentido mais lato que se possa imaginar. A família que é a turma/escola, a família que é a comunidade escolar e a família que é a família. A presença dos familiares na vida da escola, na minha experiência, só tem trazido benefícios. Juntos naquele que é o objectivo principal (a criança), traçamos estratégias, definimos abordagens especiais e ficamos a par de informações muito importantes que de outra forma não saberíamos.

G

de GOSTO.

Saber de que gostamos e porquê, leva-nos ao desenvolvimento do sentido crítico, tão importante quanto o passo seguinte, que é defender o gosto pessoal sem se esquecer de respeitar os gostos dos outros. A discussão do gosto, que tanto se disse não poder existir, leva-nos afinal ao pensamento filosófico. Estas discussões podem levar ao debate de qualquer temática que esteja presente na vida escolar familiar ou social dos nossos alunos.

H

de HOJE (AGORA).

Com a quantidade de máquinas e respetivas aplicações (úteis) que temos (não só os alunos…) é muito fácil não se estar onde se está, tal é a quantidade de respostas por dar, conversas e mensagens a meio. Esta dinâmica tem de ser contrariada diariamente pois o Presente (Agora), embora não existindo, espremido entre o que já passou e o que ainda não, é o único Tempo que temos. Presente é também “Prenda”. Desfrutemos, então.

I

de IDEIAS.

De quem são as ideias que vão surgindo durante uma conversa, exercício ou jogo? A partilha das ideias ou a percepção de que podem ser “de todos” é um passo importante para a criação de uma noção de trabalho de grupo. Desenvolver nos alunos a compreensão de que não existem à partida ideias más ou que não servem, faz com que se perca o medo de partilhar aquilo que se pensa ou sente. Muitas vezes uma ideia que surge a partir de outra é mais interessante do que a original e muda o curso da proposta inicial.

J

de JOGO.

Está-nos na massa do sangue ser competitivo e isso deve ser visto como algo saudável, desde que não nos altere nem nos torne maldosos. Todas as “letras” deste alfabeto são apresentadas de forma lúdica, interessando o aluno no processo de aprendizagem.

Se numa primeira fase “o importante é participar”, depois “o importante é divertir”, deve posteriormente focar-se a importância em perceber o jogo, delinear estratégias para, sobretudo, ultrapassar-me e fazer melhor do que da última vez.

Também nos devemos focar na invenção de novas regras, muitas vezes em colaboração com os alunos, tornando assim, o jogo, “seu/nosso”.

K

de KNOWLEDGE (CONHECIMENTO).

(já que me internacionalizo no alfabeto, uso palavras “estrangeiras”). O que sabemos e vamos ensinando, assim como o que vamos aprendendo, vão-nos enchendo a “mochila do conhecimento” o que, por um lado nos cobre de satisfação e, por outro, nos mostra o quanto fica (e ficará) por saber. Este “abismo” tem de ser fascinante e não assustador para quem lida com crianças na arte da Educação.

L

de LIBERDADE.

Se é tudo o que temos, devemos “usá-la para que não enferruje” (citando um aluno). O exercício do uso da liberdade, de pensamento, de expressão de ideias e sentimentos, prende-se com a construção da personalidade e torna-nos (a todos) seres mais humanos, solidários e emocionalmente inteligentes.

M

de MOVIMENTO.

Identificar junto dos nossos alunos as múltiplas possibilidades de movimento: grande, pequeno, concreto, abstracto, ligado ou sincopado, livre ou com alguma das inúmeras técnicas existentes. A prática do movimento e a memorização de uma sequência de movimentos, de dança ou do quotidiano, exercitam as mesmas zonas do cérebro que o cálculo matemático, como o estudo da Música desenvolve o raciocínio. A improvisação de movimento (a partir de um estímulo musical, um tema ou outro) é das práticas mais libertadoras que pode existir e, depois de ultrapassadas as inibições iniciais, não há criança (ou adulto) que não goste de improvisar movimento, usado também no início da aula como forma de aquecimento e concentração.

N

de NADA.

Como quem olha para uma folha em branco, sem saber por onde começar a desenhar ou escrever, este “medo do nada” tem de ser ultrapassado, lembrando-nos que o Zero é sempre a casa de partida para qualquer actividade. Digo aos meus alunos (e a mim, muitas vezes): “quando não souberes o que fazer, não faças nada”. Numa improvisação de grupo, por exemplo, devemos aguardar que a inspiração (vontade de entrar) chegue, que o Corpo ou a Música fale connosco, nos diga o que fazer.

O

de OUTRO.

O trabalho de observação do outro, ajuda-nos a encontrar-nos, a sabermos quem somos e como somos. Funcionando como espelhos de nós mesmos, a observação dos outros, diz-nos, quase como um GPS, onde devemos encaixar-nos. Pessoalmente, enquanto professor, têm sido sempre os meus alunos quem me ensina a dar aulas, indo de encontro às suas necessidades e interesses.

P

de POSTURA

Seja no sentido da forma como posicionamos o nosso corpo nas mais diversas situações ou a forma como devemos comportar-nos em determinadas ocasiões, a nossa postura diz muito sobre nós e podemos melhorá-la, bastando, muitas vezes, estar atento a ela. O desenvolvimento de um trabalho de postura(s) serve também como aquecimento e concentração, ideais para início de uma aula ou ensaio.

Q

de QUESTIONAR

Pratica fundamental do desenvolvimento humano, não podemos acreditar sem duvidar ou pretender conhecer sem questionar. Temos (em conjunto com os nossos alunos) de habituar-nos a que a questão faz parte do todo e que muitas perguntas ficarão para sempre sem resposta e que a dúvida, como o erro, faz parte da vida.

R

de REPETIÇÃO.

“Como se diz ensaio em francês?”, pergunto muitas vezes aos meus alunos. “Répétition”. É através da repetição de um exercício, de um jogo ou de um estudo que podemos melhorar, garantir que a aprendizagem foi integrada e assim progredir. Não deve ser vista como algo cansativo ou sem intenção. Dou também aos meus alunos o exemplo do tiro com arco. Fazer quantas tentativas? As suficientes até estarmos satisfeitos e mais uma. Para garantir que não foi um acaso.

S

de SONHO.

Não é seguramente por acaso que este, diz-se, comanda a Vida. O homem correrá sempre atrás dos seus sonhos, mesmo aqueles que sabe nunca irá alcançar. Se não sonhasse voar nunca inventaria o avião, se não corresse atrás da perfeição, mesmo sabendo que não a irá atingir, iria facilmente desistir. E essa é a única regra dos jogos: “Não se pode não jogar”.

T

de TRABALHO/TALENTO.

Sempre lado-a-lado, percentagens de um e outro para cá e para lá, o primeiro desenvolve o segundo e o segundo o primeiro. Se o talento existe? Eu digo que sim, que se vê e se sente. É aquele “brilhozinho nos olhos” de quem toca, canta ou dança. E o trabalho, nas nossas áreas, é amor, é paixão, é o aluno que estuda sem para isso ser mandado, que nos pede mais e mais, que nos apresenta um trabalho enorme, quando a proposta era pequena e isso não pode, quanto a mim, em circunstância nenhuma, ser censurado.

U

de ÚNICO.

O ensino da Música, ao contrário da Dança, por exemplo, promove a diferença a vários níveis entre os alunos. Essa diferença deve ser respeitada e fomentada. A percepção de que não necessitamos ser como outros, que podemos ser e mostrar quem somos, sem medo(s), é o que mais estimulo nos meus alunos.

V

de VERGONHA.

“Medo do que os outros pensam sobre aquilo que eu faço” tem sido a conclusão a que mais frequentemente os meus alunos chegam, concluindo depois, no meu entender muito sensatamente que, “se não sabemos o que os outros estão a pensar, para quê ter medo”? Esta é, sem dúvida, uma das principais e primeiras barreiras a vencer na aprendizagem de qualquer “arte performativa”, uma vez que a apresentação/exposição faz parte do processo e convém que seja, tão cedo quanto possível, um prazer e não uma tortura.

W

de WONDERFUL.

(outra palavra estrangeira). Principalmente por trabalhar com crianças e, muitas vezes sobre e a partir do universo infantil, lido (lidamos) com o nosso “lado de criança”. Porque não deixamos de ser crianças nunca. Somos é outras coisas em cima disso. A idade é cumulativa e não desarticulada nas nossas várias fases. Aquilo a que me refiro, neste caso, é a acreditar no fantástico, saber que as personagens de ficção existem de facto, nem que seja numa realidade paralela (as histórias) e deixar-me sempre (ou quase), maravilhar, deslumbrar, com a Fantasia.

X

Aquilo que não sabemos, aquilo que queremos saber. Tal como a perfeição, inatingível, também o conhecimento deve ser uma procura constante, embora nunca o consigamos atingir em pleno. Assim, a curiosidade é uma das qualidades a fomentar nos nossos alunos, sempre com a consciência de que é procurando saber que se vai sabendo.

Y

(a última palavra estrangeira, prometo) Esta letra estrangeira, se dita em estrangeiro e em voz alta, soa igual à pergunta mais extraordinária de todas e a que faz tudo avançar e desenvolver o conhecimento: “WHY”? Ainda que frequentemente não saiba dar resposta a tantos “Porquês” dos meus alunos, acontece-me com alguma frequência ser surpreendido pela descoberta de algum significado de um termo, resultado da discussão mais ou menos filosófica do “Porquê das Coisas”. Não devemos temer estes “ataques de perguntas”, pois é também assim que “(…) O mundo pula e avança/Como bola colorida/Entre as mãos de uma criança”. (“Pedra Filosofal” – poema de António Gedeão).

ZZZ

Tal como o silêncio faz parte da Música, bem como o espaço entre as notas e o tempo de cada uma, também o descanso faz parte do processo de trabalho e aprendizagem. Como se diz no mundo da Dança, “Dormir também é trabalho”, recuperando o corpo e a mente para o dia seguinte e dando ao cérebro tempo para arrumar as ideias (processar).

Assim sendo, Boas Férias a todos!

A APEM

A Associação Portuguesa de Educação Musical, APEM, é uma associação de caráter cultural e profissional, sem fins lucrativos e com estatuto de utilidade pública, que tem por objetivo o desenvolvimento e aperfeiçoamento da educação musical, quer como parte integrante da formação humana e da vida social, quer como uma componente essencial na formação musical especializada.

Cantar Mais

Cantar Mais – Mundos com voz é um projeto da Associação Portuguesa de Educação Musical (APEM) que assenta na disponibilização de um repertório diversificado de canções (tradicionais portuguesas, de música antiga, de países de língua oficial portuguesa, de autor, do mundo, fado, cante e teatro musical/ciclo de canções) com arranjos e orquestrações originais apoiadas por recursos pedagógicos multimédia e tutoriais de formação.

Saiba mais em:
http://www.cantarmais.pt/pt

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