De A a Z para a Música na Educação

De A a Z para a Música na Educação... por Paulo Lameiro

Paulo Lameiro

Paulo Lameiro

Musicólogo, pedagogo, comunicador e criativo português natural de Leiria. Depois de uma breve carreira como Barítono, tendo cantado a solo e integrado o Coro do Teatro Nacional de São Carlos em Lisboa, dedicou-se ao ensino e assumiu a direcção de várias escolas de música, nomeadamente o Conservatório Nacional de Lisboa, o Orfeão de Leiria e a Escola de Artes SAMP em Pousos.

É especialmente a partir desta sua aldeia natal que desenvolve, desde 1992, projectos de educação e produção artística para a primeira infância, de que se destacam Berço das Artes, Músicos de Fraldas, Concertos para Bebés e Pinhal das Artes. Tem vindo a interessar-se mais recentemente pelas práticas artísticas com a comunidade, de que sobressaem projectos como Ópera na Prisão, com reclusos, Novas Primaveras para pessoas idosas, Il Trovatore ou os Roma do Lis com comunidades de etnia cigana.

Foi membro fundador, e integrou o primeiro Conselho Científico, do Instituto de Etnomusicologia da Universidade Nova de Lisboa – FCSH, tendo publicado como etnomusicólogo em várias revistas da especialidade. Integrou ainda a Comissão de Liturgia e Música Sacra da Diocese de Leiria-Fátima, e foi o fundador e maestro titular durante 12 anos da Schola Cantorum Pastorinhos de Fátima.

É pai do Simão e da Natércia, e tem como passatempo a criação de carpas KOI para quem gosta de olhar demoradamente.

Clique no seguinte link para ler este A a Z:

A

de Nunca esquecer o essencial. Os primeiros encontros que proporcionamos entre a Música e os alunos devem ser primariamente de fruição, prazer e descoberta e não de ensino. Musicalmente, porque muito antes de organizarmos os sons, foram eles que nos organizaram. Acreditamos?

https://www.musicalmente.pt

B

de Começar sempre por ouvir e conhecer os universos e preferências musicais dos nossos alunos. Alunos e todos os outros. Tantas vezes, fascinados que estamos com a música e os processos que nos extasiam, fazemos carreiras solitárias no palco e na sala de aula. Quase sempre, ouvi-los, ouvir com os outros, Basta.

C

de ter a Voz sempre à mão. Na falta de ideias, materiais, método e sistema, plano, convicções e disposição, instrumentos afinados, sistemas de som disponíveis, do jardim de infância à universidade, em qualquer sala, recreio ou praça, façamos um coro. Cantemos.

D

de Cuidar os nossos pares, e antes de pensar em estar com os nossos alunos, estar com os nossos colegas. É na sala de professores da escola que começam as nossas aulas e a aventura maior de levar a música a toda a comunidade. Não se pense que nas escolas de música já estamos todos convertidos e é só nas salas com professores de Português e Matemática que tem lugar o Desafio.

E

de Pensar o som dos espaços de educação que habitamos. O fascínio dos nossos encontros com o som organizado por mestres é tantas vezes abalroado pelos cenários acústicos de refeitórios, corredores, pátios, jardins e bares escolares. Nem a mais perfeita sala de aula o consegue fazer esquecer. Importa-nos, pois, sem medo da palavra e dos actos que na escola ela nos implica, Educar para a qualidade de todos os sons.

F

de Investir nos equipamentos e recursos que usamos, em especial a qualidade dos ficheiros sonoros e dos sistemas de leitura e reprodução. Coisas simples, como não dar a ouvir as sinfonias de Mahler em colunas de computador compradas numa loja de conveniência. A qualidade das experiencias de fruição musical que oferecemos é em pequenos gestos e cuidados Fomentada.

G

de Evocar com os nossos alunos os professores que nos abriram caminhos inesperados e fecundos. Aqueles de quem ganhámos novos ouvidos, de quem recebemos a coragem para arriscar mudar de instrumento, mudar de gira-discos, e mudar de vida. Na minha lista estão Jorge Peixinho, Constança Capdeville, José Oliveira Lopes, João de Freitas Branco, Rui Vieira Nery, Salwa Castelo-Branco, ... Gratidão.

H

de Prever tempos e lugares. A música pode ser feita e partilhada em todos os cenários, territórios e estações do ano. Mas, como as frutas e os legumes, ela sabe-nos muito mais autêntica e intensamente se cuidarmos o onde e o quando. O mesmo vinho pode saber-nos ao melhor dos néctares ou ao fel em função do que antes comemos. Pois, devemos servir a música como se de um vinho (ou um chá) se tratasse, e cuidar o programa e os conteúdos como uma autêntica Horta.

I

de Fazer sempre música, nunca ter medo de tocar e cantar para os nossos alunos e professores. Os professores, antes de professores percecionam-se como pessoas que fazem e gostam de música. Na sala de aula os alunos não se transformam por ouvir professores virtuosos com ou sem carreira, envolvem-se sim ao ouvir e ver professores apaixonados e embrulhados nas práticas musicais. E acima de tudo, não a reproduzir, mas sim a Improvisar.

J

de nos Despirmos das fronteiras históricas. Às vezes, sem o saber, levantamos muros ao sucesso pelo uso dos rótulos velhos do clássico ao jazz, do tradicional ao pop, do world ao indie ou ao pimba. Apresentar a música com estas fronteiras, só por si, pode ser o suficiente para criar barreiras em muitas comunidades escolares, cada vez mais “multi”. Importa deixar exprimir e tocar livremente os nossos alunos, não na última aula do ano, sempre e !

K

de Intimidade, porque sempre me fascinei muito mais pelas experiências interiores, pelos longos tempos de reverberação dos espaços, que assim nos deixam ouvir o passado agora, pelas tubarias dos órgãos que trepam paredes de pedra e se elevam a dezenas de metros de altura, como na preciosa catedral de Colónia. Mas nesse mesmo burgo, quando à intimidade mais cúmplice se juntou a genialidade e a energia criadora, ouvimos vezes sem fim o Keith Jarrett no seu Köln Concert.

L

de Voltar às origens. São 11 as filarmónicas no meu concelho natal, e estamos ainda muito longe de conhecer o lugar destas formações nas suas mais diversas faces na educação, impacto social e cultura das comunidades que habitam. Entre pisar o palco de São Carlos em noites memoráveis ao lado de artistas como Fiorenza Cossotto e Plácido Domingo, e fazer um peditório no alto da serra de Aire e Candeeiros a tocar umas marchas atrás de um andor, eu nunca consegui saber muito bem onde era maior o prazer. Sendo que nem a cantar nem a tocar fliscorne eu tinha os predicados mínimos. Voltei a Leiria.

M

de Começar sempre pelos compositores e pelas obras que mais amamos e nunca pelos que constam do programa. É a nossa excitação que apaixona e não o nosso saber. No meu cardápio estão sempre Berio, Mahler, Schubert, Bach, Naragónia, Amália e Monteverdi.

N

da melhor música de Dança para se ouvir. Levado pelo folk e pelas danças do mundo conheci o Toon e a Pascale, no mesmo local onde ambos também se conheceram, no Andanças de Carvalhais. Ao mesmo tempo que se me abriu todo um universo de novos olhares sobre música e dança historicamente informadas, dancei e ouvi Alio, uma mazurka que passei só a ouvir. Este duo não tem nada de especial, a não ser que me transporta para mais perto de mim. Chama-se Naragónia.

O

de ter sempre presente o Lugar de cada coisa. Importa que o professor de instrumento saiba que muito mais importante que o violino ou o piano é a Música. E depois, não esquecer, maior do que a Música é a Arte, toda a Arte. E ainda assim, se ficarmos só pela Arte, esquecemos o mais importante, a pessoa, aquela pessoa de qualquer idade que se nos entrega entre 4 paredes. Quando falhamos, quase sempre, é porque cuidamos tudo menos a pessoa. Importa saber das coisas o seu lugar e Ordem.

P

de saber que começamos a Ser mesmo antes da conceção. Começamos por ser o sonho dos nossos progenitores, as suas vidas, o que eles ouvem e os emociona, até que deles também recebemos um corpo que vibra e se encontra pelas vibrações. Em bebés não precisamos de aulas de música, de oficinas criativas e muito menos de concertos para bebés, mas é bom que se saiba que já somos. E na verdade, o que importa mesmo é o que fazem e cantam para nós e connosco todos os que nos rodeiam, em especial os nossos Pais.

Q

de Esquecer de vez as idades e os estatutos de cada um de nós. Não podemos ter uma escola de alunos, professores e encarregados de educação. Os pais dos nossos alunos não podem ser convocados e recebidos como encarregados de educação. São pessoas, uma a uma, são professores e alunos como nós, com um desejo mais ou menos secreto, mais ou menos intenso de também tocar saxofone como a filha ou cantar como o vizinho. Uma escola que não está e se integra na comunidade. Uma escola que é a comunidade. Para Quando?

R

de dar Testemunho dos nossos primeiros mestres. Todos guardamos na memória aquele professor que radicalmente nos abriu um outro universo da música, e o brilho nos olhos que não conseguimos evitar ao partilhar esse primeiro encontro contagia quem nos rodeia com um poder muito superior à melhor das nossas aulas. Obrigado Raquel Simões.

S

de Resistir ao uso da música na sua condição de ferramenta auxiliar. Ora seja para animar festas e eventos, ou porque música e matemática é tão cool, para ajudar nas línguas estrangeiras é um must, e para disciplinar “rebeldes e hiperativos” é do melhor. Sim, tudo se pode fazer, mas sem retirar o tempo e o investimento ao essencial e mais importante, a Arte e a Música interessam-nos e valem por Si.

T

de um Poder extraordinário que a Música também tem e é, porque na verdade, valendo por si, contém na sua génese uma relação com a saúde e o bem-estar, estrutura e fortalece relações pessoais e sociais, oferece um forte impacto no que somos nas nossas dimensões física, psíquica, emocional, social e espiritual. Sim musicoterapia. Sim música nos hospitais, nas prisões, e em todo o lugar onde possa fazer falta a alguém. Música é também isto Tudo.

https://www.reuters.com/article/us-portugal-crime-opera/young-portuguese-inmates-sing-mozart-opera-on-way-to-freedom-idUSKBN1K31G2

U

de construir e viver um lema claro e mobilizador em toda a comunidade escolar. Mais importante que colocar músicos em palco, é colocar a música na vida das pessoas e das comunidades. Foi por aqui que começámos a aventura de um projecto chamado Escola de Artes SAMP, na pequena aldeia dos Pousos, junto ao Lis. Sonhar novos caminhos e energizar as nossas escolas é Urgente.

https://arestlessart.com/2015/10/26/against-the-odds/

V

de Comunidade, que não pode ser somente quem acolhe a escola, quem a integra e recebe. As práticas musicais que fazemos não devem impor-se como distintas e exclusivas de uma casta eleita, devem nascer e contruir-se com as pessoas das ruas, das aldeias, vilas e cidades que as receberam, também dos seus gostos e necessidades. Dialogar com os territórios familiares e sociais é a chave para o sucesso mais amplo de uma escola, também de música. Só quando o conseguimos podemos cantar Vitória.

W

de nos Interrogarmos sobre alguma solidão que resulta de não querer ou conseguir olhar para o lado. A música nunca foi só música. Só existe pela vibração, no movimento e no espaço, na dança e na arquitetura, no teatro, na poesia, no cinema.... Deixemo-nos abraçar por outras linguagens artísticas, sem ter necessariamente o desejo de uma obra de arte total, como sonhava o Wagner.

X

de ter a Consciência que são muito mais as dúvidas que as certezas, e que é por elas que mais avançamos. Não hesitar em partilhar essas dúvidas com os alunos e os nossos pares, com os pais e com a comunidade. A neurociência, em especial a neurobiologia, os novos rumos políticos da Europa e do mundo, a curva descendente no investimento em Cultura que teima em manter-se por todo o mundo ocidental, colocam-nos a cada dia novos desafios sobre o lugar da Música nas nossas vidas. Mas, como na matemática, é só uma variável o X.

Y

de não fazer ou pensar rigorosamente nada (para dar um pouco mais de espaço e tempo ao Z, que precisa). Yeah!!!

Z

de AQUI CONTIGO. Foi pela mão de uma filarmónica que me descobri, que me encontrei na música e na minha vida. Fui criança com adultos e idosos, fui aprendiz com mestres, toquei hinos e rapzódias, aberturas e concertos, em carreiros, palcos e adros. Aprendi a respeitar o tempo, não o da partitura, o da vida. E por ela, pela filarmónica, apesar de me ter fascinado em tempos pelos bebés, e pela origem e descoberta do que somos, hoje é o momento final da vida que me fascina. Momento esse para quem tem 8 horas de vida, 800 gramas de peso, toda a tecnologia e entes queridos ao seu redor, ou para quem tem 80 anos e ninguém a seu lado. A Música se não o é, será geminada com a última fronteira, e por isso temos experimentado na SAMP encontros pela e na música que não sei descrever, desculpem-me. Chama-se Aqui Contigo este programa, e é só um dos muitos portos nesta viagem que se inicia com a gravidez, no Primeiro Auditório. A música, esta companheira de A a Z.

https://arestlessart.com/2017/04/19/speaking-of-unspoken-things/

A APEM

A Associação Portuguesa de Educação Musical, APEM, é uma associação de caráter cultural e profissional, sem fins lucrativos e com estatuto de utilidade pública, que tem por objetivo o desenvolvimento e aperfeiçoamento da educação musical, quer como parte integrante da formação humana e da vida social, quer como uma componente essencial na formação musical especializada.

Cantar Mais

Cantar Mais – Mundos com voz é um projeto da Associação Portuguesa de Educação Musical (APEM) que assenta na disponibilização de um repertório diversificado de canções (tradicionais portuguesas, de música antiga, de países de língua oficial portuguesa, de autor, do mundo, fado, cante e teatro musical/ciclo de canções) com arranjos e orquestrações originais apoiadas por recursos pedagógicos multimédia e tutoriais de formação.

Saiba mais em:
http://www.cantarmais.pt/pt

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©  Associação Portuguesa de Educação Musical

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